Reforma da previdência: Aportes de direitos humanos para Regimes de Exceção e Cortes Orçamentários

Daniela Muradas[1]

Mestre em Filosofia do Direito (2002) e Doutora em Direito (2007) pela UFMG, Pós-doutora pela UNICAMP (2016). Professora Associada de Direito do Trabalho nos cursos de graduação e pós-graduação (mestrado e doutorado) da Faculdade de Direito da UFMG.

1. Regime de exceção e de cortes orçamentários: entre a retórica da crise e o necessário diálogo social. 2. A excepcionalidade previdenciária: os limites orçamentários como reserva do possível. 3. Os direitos econômicos culturais e sociais: o não regresso como exigência ética e como compromisso internacional. Conclusão.

  1. Regime de exceção e de cortes orçamentários: entre a retórica da crise e o necessário diálogo social

O anúncio de nova reforma previdenciária, ainda que não se tenha, no presente momento, minudências da proposta do Governo Temer, permite antever que medidas de restrição ao acesso de direitos previdenciários serão impostas mais uma vez aos cidadãos brasileiros, ao fundamento da sustentabilidade futura do sistema previdenciário oficial e do equilíbrio orçamentário público presente.

Os setores produtivos e atores financeiros são pregoeiros da reforma previdenciária. Para os agentes econômicos, a anunciada reforma e outras medidas de austeridade fiscal são indicativos macroeconômicos considerados em comportamentos e práticas de mercado, diretamente se relacionando à disposição para novos investimentos e outras exigências necessárias à retomada econômica.

A pretensão de desmantelamento do quadro de garantias estatais de natureza previdenciária por meio de políticas de austeridade fiscal não é propriamente uma singularidade Brasileira[2], nem se inaugura com a grave crise institucional que atravessa o Brasil nessa quadra histórica.

A narrativa da reforma que se anuncia[3] revolve os elementos do tradicional pensamento de modernização conservadora[4]. Aportado no argumento da “inexorabilidade” das razões econômicas, apresenta-se a justificativa para um quadro de adequação orçamentária por medidas ainda não explicitadas em face de quadro deficitário, agravado por redimensionamento de dívidas públicas por fórmulas pouco claras[5] e que chegam mesmo a desafiar o princípio da transparência, a gizar a alocação de recursos públicos na República Federativa do Brasil.

Não deve escapar à memória que as políticas de austeridade previdenciária remontam ao alvorecer do pensamento neoliberal do fim da década de setenta e, no Brasil, embalaram sucessivas alterações promovidas no quadro de garantias originárias estabelecidas pela Constituição de 1988. Desde a promulgação da Carta, seis emendas (emendas constitucionais 3/93[6], 20/98[7], 41/03[8], 47/05[9], 70/12[10] e 88/15[11]) provocaram mudanças em garantias afetas à Previdência Social nos regimes geral, próprio e complementar.

Os argumentos são repetidos como mantras sagrados e compõem, na visão de Sidnei Machado, uma “genérica narrativa sobre as motivações da reforma”, em que “ora se realça a questão demográfica brasileira, justificada pelo aumento da expectativa de vida, para sustentar a preocupação com a sustentabilidade futura do sistema previdenciário; ora se faz referência às exigências de uma reforma de urgência para contribuir com a crise gerada com o desequilíbrio fiscal”[12].

A retórica da crise previdenciária expressa de maneira singular a “culpabilização da pobreza”[13]. Não bastasse a ameaça de lesão aos direitos e/ou interesses dos cidadãos, os sucessivos vilipêndios aos direitos existenciais das gerações presentes e futuras, se lhes impõe ainda a infâmia de ser causa. A gramática de culpabilização das vítimas é ainda um algo além da retórica da motivação[14]. Atua diretamente no desempoderamento dos atores sociais, em um franco quadro de aprofundamento das assimetrias econômicas e sociais, em quebra do equilíbrio necessário ao pacto social amplo que se propõe.

Como motriz da retomada do crescimento, o argumento econômico, com a inexorabilidade que lhe é jaez, imprime urgência; o que pode traduzir, para além do caráter regimental peculiar nos processos legislativos em curso[15], o propósito imediatista de solução de um impasse de grande magnitude social sem o necessário e adequado diálogo social.

Diálogo social, aliás, a que se obrigou a República Federativa do Brasil por compromissos internacionais múltiplos, e em particular pela Convenção número 144 da Organização Internacional do Trabalho, pela qual decisões que venham impor efeitos na vigência de norma internacional do trabalho, dentre as quais decorrentes dos compromissos constitucionais com a entidade (art. 19 §8º)[16] e que estabelecem compromissos internacionais mínimos em matéria de proteção de social, devem ser dialogadas não apenas formalmente com entidades sindicais com representatividade[17] nos respectivos setores sociais a serem atingidos[18].

Diálogo social que exige um olhar não redutor da posição de aderente em um projeto político de equilíbrio econômico em prejuízo do equilíbrio social.

Diálogo social que se impõe em face do devido processo negocial coletivo e que guarda caráter dialogal sistêmico com as normas processuais civis, aplicáveis como norma geral de solução e aplicação de conflitos sociais (art. 2º, §2, Lei de Introdução às normas do Direito Brasileiro[19]).

Nesse sentido, de se destacar ser a expressão da dialogicidade do processo comum o instituto do amicus curiae, que provocou drástico alargamento no círculo tradicional de intérpretes e aplicadores das normas jurídicas em nosso sistema[20].

No terreno hermenêutico constitucional, a ideia de sociedade aberta dos intérpretes da Constituição encontra-se plenamente contemplada no ordenamento brasileiro, tanto no controle concentrado de constitucionalidade [Ação Direta de Inconstitucionalidade, Ação Declaratória de Constitucionalidade, ADPF] como no controle difuso de constitucionalidade. O que exige, por idênticos fundamentos, concluir pelo necessário caráter dialógico a permear o mapeamento do estado da excepcionalidade.

Diálogo social necessário e não enganoso que supõe considerar possibilidades, desenhos institucionais variados na multiplicidade de saberes e olhares sobre a realidade, e desigualdades iniciais[21].

Nas palavras de Bagolini:

Deste ponto de vista uma participação autêntica, e não enganadora, parece implicar seja a possibilidade do diálogo entre indivíduos de diversas tendências ideológicas, seja, consequentemente, a confiança em uma democracia pluralista e, sobretudo, a confiança na política como atividade que ultrapassa os limites da tecnoestrutura[22].

O olhar dos direitos humanos exige ter em conta o pluralismo em dimensão substancial da democracia nas raias obrigacionais de perceber a dimensão do outro, atenta ao contraditório como princípio de processualidade, no campo das ideias e da formação e da informação.

Assim, a democracia como projeto e como prática[23]:

[…] supone ampliar la participación y la deliberación pública a amplios sectores de la sociedad que se han visto secularmente marginados, pero también avanzar en la efectiva titularidad de derechos económicos, sociales y culturales. […]. Significa que la ciudadanía, como valor irreductible, prescribe el pleno derecho de cada uno, por el solo hecho de ser parte de la sociedad e independientemente de sus logros individuales y recursos monetarios, a acceder a ciertos umbrales de bienestar social y reconocimiento. Esto también significa avanzar hacia una mayor igualdad en materia de acceso, sobre todo en campos como la educación, la salud, el empleo, la vivienda, los servicios básicos, la calidad ambiental y la seguridad social. Al traducirse en umbrales mínimos —e incrementales— de bienestar y de prestaciones, indirectamente la igualdad de derechos impone límites a la desigualdad en el acceso, sobre todo cuando esa desigualdad, en cierto punto, se traduce en que parte de la sociedad se vea privada del acceso definido normativamente a partir del enfoque de la titularidad de derechos. La igualdad de derechos provee el marco normativo y sirve de base a pactos sociales que se reflejan en más oportunidades para quienes menos tienen. Un pacto fiscal que contemple una estructura y una carga tributaria con mayor efecto redistributivo, capaz de fortalecer el rol del Estado y la política pública de modo de garantizar umbrales de bienestar, es parte de esta agenda de la igualdad en la que se incluye una institucionalidad laboral que proteja la seguridad del trabajo[24].

Por fim, em uma perspectiva dialogal, exige-se ainda delinear o problema com o olhar mais largo e enfrentar a questão sob a ótica das possibilidades. A restrição de direitos é a única alternativa?

  1. A EXCEPCIONALIDADE PREVIDENCIÁRIA: os limites orçamentários como reserva do possível

Ab initio, as consideranda de ordem epistemológica e metodológica.

Para se dimensionar o problema da excepcionalidade orçamentária, é necessário analisá-la sob o olhar dos direitos humanos, a exigir uma descrição do universo orçamentário não como uma cifra que, por tamanhos dígitos, torna-se algo mais abstrato do que já é um algarismo e que relacionado a tantos outros indicadores passa a grau de abstração ainda maior, de sorte que só os que não sofrem alguma forma de discalculia, como eu, podem atribuir-lhe algum sentido[25].

Propõe-se então analisar o orçamento como algo conexo ao seu sentido essencial: o de provimento de uma necessidade humana concreta. Engendra-se assim na compreensão numérica os caros valores antropo-éticos[26]. Compreensão que exige ir além das rubricas e tantos provimentos administrativos burocráticos, para contextualizar as temáticas, apresentar as problematizações emergentes da própria tessitura social envolvidas nas respectivas dotações, bem como cotejar as referências das alocações, revelando, globalmente, a linha de coerência da aplicação do conjunto de receitas consideradas as necessidades na complexidade social[27].

Estudos econômicos recentes sugerem a ineficácia das políticas de austeridade previdenciária[28] e põem em xeque a ideia da restrição de direitos sociais como mecanismo único apto ao saneamento orçamentário da Previdência Social. As variadas propostas alternativas ao regime de austeridade previdenciário, em particular as que discutem a questão sob a ótica desenvolvimentista e as que propõem uma justiça tributária mais equânime continuam sendo solenemente ignoradas[29].

Desconsiderando a possibilidade de alternativas ao modelo de austeridade fiscal, triunfa nos círculos institucionais a ideia de excepcionalidade econômica a justificar novos pactos sociais de revisão das dimensões do Estado de Bem-Estar Social.

Nesse sentido, conclui Antonio Baylos:

Mas o mais significativo –e quiçá no que menos se tem reparado– é que tem-se conseguido impor uma situação de exceção que justifica a emanação de normas de urgência sobre a base de uma excepcionalidade a qual derroga elementos essenciais dos direitos democráticos reconhecidos com o caráter fundamental nas respectivas constituições nacionais bem como em Tratados Internacionais sobre direitos humanos que vinculam os Estados-membros[30].

Proliferam argumentos orçamentários, que se destilam como dogmas aptos a justificar, inclusive, o que demonstra grau de autoridade do discurso econômico, a ruptura de mandato político alcançado por processo eleitoral válido por presunção de direito e legítimo por ser estribar em voto direto e secreto ao que se obriga todos os cidadãos brasileiros entre 18 e 70 anos e se faculta entre 16 a 18 anos e para os maiores de 70 anos.

3 OS DIREITOS ECONÔMICOS CULTURAIS E SOCIAIS: o não regresso como exigência ética e como compromisso internacional

Na contramão da pauta reformista, os direitos humanos, com lastro nos valores universais da dignidade da pessoa, liberdade, igualdade e fraternidade figuram como conquistas históricas definitivas da humanidade, seguem reclamando tutela vigorosa. Relativamente aos direitos econômicos, sociais e culturais exige-se ainda uma realização sempre progressiva, razão pela qual acerca destes direitos não se pode admitir o retrocesso.

Na lapidar passagem de Fábio Konder Comparato:

A consciência ética coletiva […] amplia-se e aprofunda-se com o evolver da História. A exigência de condições sociais aptas a propiciar a realização de todas as virtualidades do ser humano é, assim, intensificada no tempo e traduz-se, necessariamente, pela formulação de novos direitos humanos. É esse movimento histórico de ampliação e aprofundamento que justifica o princípio da irreversibilidade dos direitos já declarados oficialmente, isto é, do conjunto de direitos fundamentais em vigor. Dado que eles se impõem, pela sua própria natureza, não só aos Poderes Públicos constituídos em cada Estado, como a todos os Estados no plano internacional, e até mesmo ao próprio Poder Constituinte, à Organização das Nações Unidas e a todas as organizações regionais de Estados, é juridicamente inválido suprimir direitos fundamentais, por via de novas regras constitucionais ou convenções internacionais[31].

Embebidos pelos mais altos valores humanistas, encontram-se nos documentos internacionais consagradores dos direitos humanos expressas disposições proibitivas de redução do alcance de proteção da pessoa humana, sendo peculiar à categoria de direitos econômicos[32] sociais e culturais a progressividade[33].

O não retrocesso social, para além de uma obrigação internacional decorrente de expressas disposições em tratados internacionais ratificados pela República Federativa do Brasil figura como princípio geral de direito internacional público, a orientar o cumprimento de obrigações internacionais no âmbito dos direitos humanos.

O seu largo reconhecimento por instâncias internacionais competentes, em particular pelos Órgãos aos quais compete o controle especial da matéria em âmbito global e nos sistemas regionais, nos permite categorizá-lo como fonte de direito, na conformidade com o art. 38 da Constituição da Corte Internacional de Justiça. Como fonte do Direito, de suas raias normativas defluem obrigações que se enquadram como ius cogens, já que na larga tradição internacionalista essa natureza se confere aos direitos humanos. Assim, a vedação de regressividade social é primado se impõe a todos os sujeitos de Direito Internacional Público, pela natureza imperativa e operativa a que se lhe empresta, conforme extenso repertório de sua aplicação pelos Organismos Internacionais no âmbito de suas competências reconhecidas por tratados ratificados pela República Federativa do Brasil.

A progressividade econômica, social e cultural inscrita nos tratados internacionais de Direitos Humanos institui, valendo-me das considerações de Rolando E. Gialdino, obrigações internacionais em três dimensões distintas: em caráter dinâmico, unidirecional e em razão do núcleo rígido interno dos direitos humanos[34].

O compromisso internacional de progressividade, em perspectiva dinâmica, se expressa pelos esforços de implementação dos direitos econômicos, sociais e culturais por todos os meios adequados, considerados os recursos disponíveis em aplicação que preconize o sentido unidirecional de avanço, de marcha adiante.

Como norma programática que é, anuncia plano de ações concretas, que em consonância com os organismos multilaterais competentes, dentre os quais o Alto Comissariado das Nações Unidas para os Direitos Humanos, consistem em deveres-providência, caracterizando violação ao PIDESC condutas omissivas estatais[35].

Entendimento que se alinha ao conjunto teórico de referência da aplicabilidade das normas jurídicas assentado nos círculos científicos[36] e institucionais brasileiros, pelo qual as normas programáticas de natureza superior prescrevem deveres ao Poder Público e as condutas omissivas significam, sobretudo, a ruptura com o Estado de Direito[37].

De se argumentar, então, poder ser o dever programático de progressão nos níveis globais de proteção social obstado pela reserva do possível e mitigado em regimes de exceção conforme o estatuto jurídico de salvaguarda e garantias da pessoa humana no plano internacional. Nesse ponto toca a máxima “ad impossibilia nemo tenetur” – ninguém é obrigado a fazer o impossível.

Eis o quid da questão! Sob o prisma moral, chega a ser tormentosa a aporia. Afinal, os efeitos das medidas preconizadas recaem em segmentos sociais de reconhecida vulnerabilidade[38], quais sejam, idosos e pessoas com deficiência dependentes da Previdência Social.

Assim, a se reconhecer o estado de exceção e por conseguinte ações de recomposição das reservas e previsões orçamentárias como imposição de realidade, de se impor precedentemente os ônus econômicos decorrentes da limitação orçamentária às classes sociais que, avaliadas as possibilidades econômicas, contam com maior capacidade de contribuir, à luz do que preconiza a igualdade como princípio de justiça, e considerada a máxima aristotélica de tratamento na medida de desigualdade, e o princípio da capacidade contributiva, como baliza da lei.

Assim, se na matemática da crise, a equação há de considerar como variável humanista o senso tão refinado quanto pragmático de igualdade jurídica, os cortes ou aportes econômicos devem preferentemente provir da classe social que, sopesada a condição econômica, tem maior capacidade contributiva.

Conforme expõe Jorge Leite, há de se considerar, no mínimo, o princípio constitucional da igualdade, a orientar a repartição dos sacrifícios em momentos de crises:

O princípio da igualdade proíbe, como repetidamente tem sido afirmado pela doutrina e pela jurisprudência, medidas que estabeleçam distinções discriminatórias, ou seja, diferenças de tratamento materialmente não fundadas ou sem fundamento razoável, objetivo e racional (Ac. do TC 409/99), diferenças que tanto se podem traduzir na atribuição de uma vantagem como na imposição de uma desvantagem a determinada categoria social, sendo então importante apurar, uma vez que a igualdade é, por definição, um problema relacional, se, no caso concreto, a atribuição da vantagem ou a imposição da desvantagem à categoria social em causa tem ou não fundamento bastante, isto é, se há fundamento que sustente a justiça do esforço suplementar imposto[39].

A conclusão não se toma apenas pelo princípio de justiça. Afinal, o princípio da capacidade contributiva como primado constitucional que orienta o Direito Financeiro e notadamente o campo da formação de receitas públicas é largamente reconhecido em nossos Tribunais. Ademais, “o direito tem uma função social para cumprir, não pode ser concebido, de modo realista, sem referência a sociedade que deve reger”[40].

Em contexto de escassez, em respeito as obrigações internacionais que defluem do Pacto de Direitos Econômicos Sociais e Culturais (art. 26) e da Carta Americana de Direitos Humanos e do Protocolo Adicional de São Salvador, o núcleo de direitos já realizados não pode ser prejudicado em razão de o Estado tomar parte em diplomas internacionais consagradores de direitos humanos senão a observar, o valor de referência da igualdade[41], até porque a própria República Federativa do Brasil preconiza dentre suas finalidades a superação das desigualdades sociais e regionais.

Na síntese de Flávia Piovesan:

À luz de uma interpretação dinâmica e evolutiva, compreendendo a Convenção Americana como um living instrument, no já citado caso Villagran Morales contra a Guatemala, a Corte afirmou que o direito à vida não pode ser concebido restritivamente. Introduziu a visão de que o direito à vida compreende não apenas uma dimensão negativa –o direito a não ser privado da vida arbitrariamente–, mas uma dimensão positiva, que demanda dos Estados medidas positivas apropriadas para proteger o direito à vida digna – o “direito a criar e desenvolver um projeto de vida”. Esta interpretação lançou um importante horizonte para proteção dos direitos sociais. Em outros julgados, a Corte tem endossado o dever jurídico dos Estados de conferir aplicação progressiva aos direitos sociais, com fundamento no art. 26 da Convenção Americana de Direitos Humanos, especialmente em se tratando de grupos socialmente vulneráveis. No caso niñas Yean y Bosico vs. Republica Dominicana, a Corte enfatizou o dever dos Estados no tocante à aplicação progressiva dos direitos sociais, a fim de assegurar o direito à educação, com destaque à especial vulnerabilidade de meninas. Sustentou que: “en relación con el deber de desarrollo progresivo contenido en el art. 26 de la Convención, el Estado debe prover educación primaria gratuita a todos los menores, en un ambiente y condiciones propicias para su pleno desarrollo intelectual”.

No caso Acevedo Buendía y otros (“Cesantes y Jubilados de la Contraloría”) vs. Peru (2009),38 a Corte condenou o Peru pela violação aos direitos à proteção judicial (art. 25 da Convenção Americana) e à propriedade privada (art. 21 da Convenção), em caso envolvendo denúncia dos autores relativamente ao não cumprimento pelo Estado de decisão judicial concedendo aos mesmos remuneração, gratificação e bonificação similar aos percebidos pelos servidores da ativa em cargos idênticos. Em sua fundamentação, a Corte reconheceu que os direitos humanos devem ser interpretados sob a perspectiva de sua integralidade e interdependência, a conjugar direitos civis e políticos e direitos econômicos, sociais e culturais, inexistindo hierarquia entre eles e sendo todos direitos exigíveis. Realçou ser a aplicação progressiva dos direitos sociais (art. 26 da Convenção) suscetível de controle e fiscalização pelas instâncias competentes, destacando o dever dos Estados de não regressividade em matéria de direitos sociais. Endossou o entendimento do Comitê da ONU sobre Direitos Econômicos, Sociais e Culturais de que as medidas de caráter deliberadamente regressivo requerem uma cuidadosa análise, somente sendo justificáveis somente quando considerada a totalidade dos direitos previstos no Pacto, bem como a máxima utilização dos recursos disponíveis[42].

Sob a ótica de um dever que se irradia em caráter prospectivo, o não regresso alcança as margens temporais dos direitos humanos. Isso porque a necessidade de adequação de reservas financeiras também se anuncia como um pacto social futuro, em caráter reducionista de padrões sociais para gerações vindouras.

Valendo-me da sórdida ironia machadiana, “com os suspiros de uma geração é que se amassam as esperanças de outra…”[43] e, não raro, infunde-se o respeito ao caráter retrospectivo do princípio da segurança jurídica (ato jurídico perfeito, direito adquirido e coisa julgada) esquecendo-se solenemente do caráter prospectivo que lhes impõem os indissociáveis princípios da progressividade e não regresso.

Na advertência de Ingo Sarlet:

En cuanto al alcance de la seguridad jurídica, la dignidad de la persona humana no exige sólo una protección frente a actos de cuño retroactivo (esto, claro, cuando esté en juego una efectiva o potencial violación de la dignificad en alguna de sus manifestaciones), sino que incluye […] una protección contra las medidas regresivas, aunque no puedan considerarse propiamente como retroactivas, ya que no afectan derechos adquiridos, actos jurídicos perfectos o la cosa juzgada. Basta recordar aquí la posibilidad de que el legislador, sea por medio de una reforma constitucional, sea por una reforma en el plano legislativo, suprima determinados contenidos de la Constitución o revoque normas legales destinadas a la reglamentación de disposiciones constitucionales, en especial en materia de derechos sociales, aunque lo haga con efectos meramente prospectivos. Así, nos topamos con la noción de lo que ha sido “bautizado” por la doctrina, –entre otros términos– como prohibición (o veda) de retroceso[44].

Para além da preservação dos níveis gerais de proteção, algumas garantias defluem da obrigação internacional de não regressividade social. Para além do dever geral de providência, a que se vinculam os poderes públicos a estabelecerem a observância dos deveres promocionais de bem-estar das gerações presentes e vindouras, há de se reconhecer na linha mesmo considerações mais profundas das linhas de pensar sobre o conceito de pessoa humana como sujeito de direito internacional público a merecer hoje verdadeira revisão em seus contornos tradicionais. Nesse sentido desenvolvem-se os entendimentos acerca do reto uso dos recursos naturais e as exigências de um desenvolvimento econômico sustentável.

Por aplicação desse dever promocional de caráter prospectivo[45] se reconhece que “no Estado Democrático de Direito a lei passa a ser, privilegiadamente, um instrumento de ação concreta do Estado, tendo como método assecuratório de sua efetividade a promoção de determinadas ações pretendidas pela ordem jurídica”[46].

A ordem jurídica, ao instituir e estruturar os direitos previdenciários, estabelece níveis sociais que se incorporam ao “patrimônio jurídico da cidadania”, na expressão de Luis Roberto Barroso, e não podem ser simplesmente suprimidos ou mitigados à luz de balizas humanizadoras tantos dos seres em sua dimensão existencial concreta, senão também na sua projeção existencial vindoura[47].

Eis o sentido mais profundo do não regresso em direitos sociais: a solidariedade social na perspectiva existencial futura da pessoa humana, a exigir conformidade entre os desígnios de hoje e os desafios do amanhã. Sentido que impõe máxima responsabilidade no uso racional dos bens dispostos à serviço do humano, conforme já se delineou nos quadros do direito internacional de proteção ambiental.

CONCLUSÃO

No enlace entre a Economia e o Direito, há quem apregoe a preponderância da racionalidade instrumental da economia nas escolhas e decisões jurídicas, visão que desafia, de modo vezeiro, o sentido mais humanizado do Direito.

Afinal, ainda que consideradas a limitação de riquezas e as inevitáveis escolhas, rememore-se com Kant que no reino dos fins o que não tem preço tem dignidade, impondo-se a preferência do ser humano, de seu bem-estar, nas difíceis escolhas impostas pelas contingências de realidade.

Assim, compartilhando dos ensinamentos de E. Morin, a economia deve ser regida não por uma razão instrumental, mas pela máxima antropo-ética da excelência humana.

Na encadeação da lógica humanista e não matemática, pode evidenciar que o menor ou melhor caminho entre dois pontos nem sempre será uma reta… que existem pontos fora da curva e que, estimulados pela criatividade, outros desenhos podem ser rascunhados…

A esperar o porvir, oxalá em uma sociedade vazada nos mais altos e caros valores humanistas que o dialogo social autêntico e os compromissos internacionais sempre hão de afiançar.


 

[1]  Ensaio em homenagem aos homens que, no plano das ideias ou das práticas, se dedicam à progressividade e não retrocesso social, em particular à A.A. CANÇADO TRINDADE, J.J. GOMES CANOTILHO, INGO W. SARLET, ROLANDO E. GIALDINO e CHRISTIAN COURTIS. Para JORGE LEITE com a expressão máxima de respeito, admiração e amizade.

[2]  Cf.: “It is an open secret that the welfare state has become a basket case and must therefore be reformed or at least reconstructed and modernized. Globalization and European integration, demographic change and individualization processes in society have, slowly but surely, eroded the welfare state foundations of EU member states. If the renovation work does not start soon, according to the conventional wisdom, the welfare state will collapse under the weight of its costs and the burden of redistribution. What has been the mainstream perspective on social policy in economics as well as in politics over the past two decades, may become another TINA (there is no alternative) imperative in the aftermath of the recent world financial crisis and the ensuing ‘absurd austerity policies’ almost everywhere in Europe”. (ARNE HEISE, H. L., The effects of european austerity programmes on social security systems. Modern Economy, 2011, 2, 498-513). Sobre o tema, confira ainda: STREECK, W. (1999), Competitive Solidarity: Rethinking the “European Social Model”. MPIfG Working Paper, (99/8). DAVAKI, K.; MOSSIALOS, F. Financing and delivering health care. Social Policy Developments in Greece, Ashgate Publisher, Aldersot, 2006, pp. 55-72. EUROPEAN COMMISSION. The distributional effects of austerity measures: a comparison of six eu countries. Social Situation Observatory – Income Distribution and Living Conditions, 2011. FERREIRA, A. C., A sociedade de austeridade: poder, medo e direito do trabalho de exceção. Revista Crítica de Ciências Sociais [Online], 95 | 2011. Disponível em: <http://rccs.revues.org/4417>. Acesso em: 28 jul. 2016. BUSCH, K.; HERMANN, C.; HINRICHS, K.; SCHULTEN, T., Euro crisis, austerity policy and the european social model: how crisis policies in southern europe threaten the EU’s social dimension. Friedrich-Ebert-Stiftung. International Policy Analysis. Hiroshimastraße 28 | 10785 Berlin | Germany. February, 2013. Disponível em: <http://library.fes.de/pdf-files/id/ipa/09656.pdf>. Acesso em: 28 jul. 2016. TEPE, M. S.; VANHUYSSE, P., Elderly bias, new social risks, and social spending: change and timing in eight programs across four worlds of welfare, 1980–2003. Journal of European Social Policy, 2009, p. 217–234. Disponível em: < http://ssrn.com/abstract=1370004>. Acesso em: 28 jul. 2016.

[3]  Já se anuncia, por exemplo, com ênfase, na atualidade, a desvinculação de benefícios sociais e previdenciários do salário mínimo, conforme consta do Programa Uma Ponte para o Futuro, lançado em Brasília, em 29/10/2015, pela Fundação Ulysses Guimarães e PMDB.

[4]  Para uma compreensão do termo “modernização conservadora” –ou “revolução passiva”, no sentido gramsciano–, e como este foi utilizado na tradição brasileira, sugerimos: FERNANDES, F., A revolução burguesa no Brasil: ensaio de interpretação sociológica. 3. ed. Rio de Janeiro: Zahar, 1981; VIANNA, L. W., Liberalismo e sindicato no Brasil. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1976; SOUZA, J., A construção social da subcidadania: para uma sociologia política da modernidade periférica. Belo Horizonte: UFMG, 2003.

[5]  De se notar algumas contradições das propostas e medidas em face da aprovação da elevação da desafetação de receitas no interesse do orçamento público, o que impacta as receitas do Instituto Nacional do Seguro Social. Tradicionalmente, a desvinculação das receitas da União, incluída pela Emenda Constitucional de Revisão nº 1, em 1994, tinha como objetivo rearranjar as contas da Fazenda, mantendo a estabilidade econômica. A previsão do art. 71 do ADCT foi complementada pelo que hoje se conhece como DRU, via Emenda Constitucional nº 27/01, mantida pela EC 42/03. A parcela que se desvincula do orçamento que constitucionalmente deveria ser direcionado à Previdência é massiva (20%), agredindo a concretização dos direitos sociais, o que referido “redimensionamento” não leva em consideração.

[6]  BRASIL. Emenda Constitucional nº 3, de 17 de março de 1993. Altera os arts. 40, 42, 102, 103, 155, 156, 160, 167 da Constituição Federal. Diário Oficial da União, 18 mar. 1993. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Constituicao/Emendas/Emc/emc03.htm>. Acesso em: 28 jul. 2016.

[7]  BRASIL. Emenda Constitucional nº 20, de 15 de dezembro de 1998. Modifica o sistema de previdência social, estabelece normas de transição e dá outras providências. Diário Oficial da União, 16 dez. 1998. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/emendas/emc/emc20.htm>. Acesso em: 28 jul. 2016.

[8]  BRASIL. Emenda Constitucional nº 41 de 19 de dezembro de 2003. Modifica os arts. 37, 40, 42, 48, 96, 149 e 201 da Constituição Federal, revoga o inciso IX do § 3 do art. 142 da Constituição Federal e dispositivos da Emenda Constitucional nº 20, de 15 de dezembro de 1998, e dá outras providências. Diário Oficial da União, 31 dez. 2003. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/emendas/emc/emc41.htm>. Acesso em: 28 jul. 2016.

[9]  BRASIL. Emenda Constitucional nº 47, de 5 de julho de 2005. Altera os arts. 37, 40, 195 e 201 da Constituição Federal, para dispor sobre a previdência social, e dá outras providências. Diário Oficial da União, 6 jul. 2005. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/emendas/emc/emc47.htm>. Acesso em: 28 jul. 2016.

[10]  BRASIL. Emenda Constitucional nº 70, de 29 de março de 2012. Acrescenta art. 6º-A à Emenda Constitucional nº 41, de 2003, para estabelecer critérios para o cálculo e a correção dos proventos da aposentadoria por invalidez dos servidores públicos que ingressaram no serviço público até a data da publicação daquela Emenda Constitucional. Diário Oficial da União, 30 mar. 2012. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/emendas/emc/emc70.htm>. Acesso em: 28 jul. 2016.

[11]  BRASIL. Emenda Constitucional nº 80, de 7 de maio de 2015. Altera o art. 40 da Constituição Federal, relativamente ao limite de idade para a aposentadoria compulsória do servidor público em geral, e acrescenta dispositivo ao Ato das Disposições Constitucionais Transitórias. Diário Oficial da União, 8 maio 2015. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/emendas/emc/emc88.htm>. Acesso em: 28 jul. 2016.

[12]  MACHADO, S., As ambiguidades da Reforma Previdenciária. Gazeta do Povo Website, 17 fev. 2016. Disponível em: <http://www.gazetadopovo.com.br/vida-publica/justica-e-direito/artigos/as-ambiguidades-da-reforma-previdenciaria-ek37o6mgelm5z21g4dwexul2f>. Acesso em: 28 jul. 2016.

[13]  Sobre o tema Cf.: SIQUEIRA, L., A pobreza como “disfunção” social: a culpabilização e a criminalização do indivíduo. Argumentum, Vitória (ES), v. 6, n. 1, p. 240-252, jan./jun. 2014. Disponível em: <http://periodicos.ufes.br/argumentum/article/view/6032>. Acesso em: 28 jul. 2016.

[14]  Daí exsurge o posicionamento crítico de Noam Chomsky, em Carta Aberta às Nações Unidas, na qual, em conjunto com outros pensadores, questiona o posicionamento da organização em relação aos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável que, em sua visão, não representam os interesses da maioria da população, os explorados e oprimidos pela ordem política e econômica atual. (CHOMSKY, N. et al. Open letter to the United Nations. Disponível em: <http://therules.org/petition/sdg-open-letter/>. Acesso em: 28 jul. 2016).

[15]  As proposições legislativas podem se submeter a quatro regimes distintos (urgência, prioridade, ordinário e especial). O Congresso vem utilizando, com frequência abnormal, o regime de urgência, no qual dispensa-se qualquer exigência, interstício ou formalidade, incluindo-se o mais rápido possível a proposição na ordem do dia, sendo indispensáveis apenas a distribuição de textos, os pareceres de comissão e o quórum de deliberação. Há três tipos de urgência, relativos à natureza da matéria, por requerimento de parlamentares ou por solicitação do Presidente da República. Sobre o assunto, cf.: QUEIROZ, A. A. de, Poder Legislativo: como é organizado, o que faz e como funciona. Brasília, DF: DIAP, 2014. Disponível em: <http://www.sindsaudejau.com.br/cartilhas/poder_legislativo.pdf>. Acesso em: 21 jan. 2016. p. 38-39.

[16]  OIT. Convenção nº 144, de 1976. Consultas tripartites sobre as normas internacionais do trabalho. Disponível em: <http://www.oitbrasil.org.br/node/497>. Acesso em: 28 jul. 2016.

[17]  A Organização do Trabalho, por meio da Recomendação 152, atribui a expressão organizações representativas o sentido de efetiva representatividade social, à medida que, em claro papel de interpretação autêntica, exige a participação de entidades de trabalhadores e de empregadores que contem com maior representatividade local nas consultas reguladas pela Convenção 144. De se recordar que, no âmbito da legislação brasileira, que a Lei 11.648, de 31 de março de 2008, confiou às Centrais Sindicais a coordenação da representação dos trabalhadores por meio das organizações sindicais a ela filiadas e contam com a prerrogativa de participação em negociações em fóruns, colegiados de órgãos públicos e demais espaços de diálogo social que possuam composição tripartite, nos quais estejam em discussão assuntos de interesse geral dos trabalhadores.  Além disso, a Recomendação 152 da Organização Internacional do Trabalho reitera como condição de validade da consulta social, o pleno gozo das prerrogativas ínsitas à liberdade sindical pelas entidades consultadas, o que evidencia a permanente preocupação da Organização Internacional do Trabalho com as condições do exercício do direito de liberdade sindical na particular dinâmica de consultas afetas às normas e obrigações internacionais do trabalho. Desse modo, as entidades consultadas, tanto no plano de sua constituição, administração e principalmente no exercício de ações concretas devem gozar de plena liberdade, o que inclui a liberdade de manifestação acerca de propostas que afetem os compromissos internacionais em direitos sociais, o direito de negociar as decisões que venham afetar a classe dos trabalhadores e os setores representados, bem como a adoção de ações coletivas de pressão voltadas ao atendimento de seus interesses.

[18]  O artigo 2.1 da Convenção 144 da Organização Internacional do Trabalho impõe para seus signatários o compromisso de pôr em prática procedimentos que assegurem consultas efetivas a entidades de maior representatividade local de empregadores e dos trabalhadores, eleitos para essa finalidade, sobre os assuntos relacionados com as atividades da Organização Internacional do Trabalho. Figuram dentre as obrigações de mecanismos de diálogo social as consultas referentes as informações prestadas para fins de debates técnicos, considerando inclusive, “ as respostas dos Governos aos questionários relativos aos pontos incluídos na ordem do dia da Conferência Internacional do Trabalho e os comentários dos Governos sobre os projetos de texto a serem discutidos na Conferência;” Também são consideradas temáticas de consulta efetiva “as propostas que devam ser apresentadas à autoridade ou autoridades competentes relativas à obediência às convenções e recomendações, em conformidade com o artigo 19 da Constituição da Organização Internacional do Trabalho”; bem como o reexame, dentro de intervalos apropriados, de Convenções não ratificadas e de recomendações que ainda não tenham efeito, para estudar que medidas poderiam tomar-se para colocá-los em prática e promover sua retificação eventual e as propostas de denúncias de convenções ratificadas. A Recomendação 152 alargou ainda a obrigação de consulta tripartite para as questões que possam afetar as memórias, ou seja, as informações comunicadas à Secretaria Internacional do Trabalho em virtude do artigo 22 da Constituição da Organização Internacional do Trabalho.

[19]  BRASIL. Decreto-Lei nº 4.657, de 4 de setembro de 1942. Lei de Introdução às Normas do Direito Brasileiro. Diário Oficial da União, 9 set. 1942. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto-lei/Del4657.htm>. Acesso em: 16 maio 2016.

[20]  O Novo Código de Processo Civil enuncia que “o juiz ou o relator, considerando a relevância da matéria, a especificidade do tema objeto da demanda ou a repercussão social da controvérsia, poderá, de ofício ou a requerimento das partes, solicitar ou admitir a manifestação de pessoa natural ou jurídica, órgão ou entidade especializada, com representatividade adequada, no prazo de quinze dias da sua intimação”. (BRASIL. Lei nº 13.105, de 16 de março de 2015. Código de Processo Civil. Diário Oficial da União, 17 mar. 2015. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_Ato2015-2018/2015/Lei/L13105.htm>. Acesso em: 3 jun. 2016) Em Palestra proferida no dia 22/11/2011 em Audiência Pública no Congresso Nacional defendi que o alcance geral da figura do amicus curiae, tal qual proposto no projeto, amplia o raio de intérpretes das normas do ordenamento jurídico, circunscritos ao tradicional círculo de operadores/intérpretes oficias, engendrando no processo hermenêutico elemento pluralista da sociedade. Em compasso com os ensinamentos de Peter Härbele, para quem “Todo aquele que vive no contexto regulado por uma norma e que vive com este contexto é, indireta ou, até mesmo diretamente, intérprete dessa norma. ”. A participação ativa do destinatário da norma quebra o monopólio da interpretação/aplicação por operadores tradicionais e oficias, figurando como medida de adequação às exigências de uma sociedade democrática e plural e que se faz presente também como mecanismo legitimador do processo legislativo/hermenêutico institucionalizado.

[21]  Considerando as dificuldades de acesso à informação, um processo negocial coletivo deveria observar o que prescreve o princípio da hipossuficiência probatória. Dispõe o Código de Processo Civil que “considerando as circunstâncias da causa e as peculiaridades do fato a ser provado, o juiz poderá, em decisão fundamentada, observado o contraditório, distribuir de modo diverso o ônus da prova, impondo-o à parte que estiver em melhores condições de produzi-la. ” O instituto tem conexão com o direito de acesso à justiça e realização de direitos humanos. Por técnica de interpretação histórica (e não para o exercício de uma egolatría) mas tão somente para desvelar a mens legislatores do dispositivo processual registro que repousam nas memorias da Comissão Especial da Câmara do Congresso Nacional do Código de Processo Civil síntese da defesa técnica do instituto de minha lavra “O princípio da aptidão para a prova, tal qual apresentado na proposta, permite ao juiz a inversão do ônus da prova, quando verificada a hipossuficiência probatória de uma das partes, independentemente do prévio reconhecimento legislativo de uma posição de vulnerabilidade. Trata-se de importante medida de quebra do formalismo abstrato que deflui do princípio da igualdade e isonomia processual. […] As relações privadas nem sempre se pautam pela igual oportunidade de reconstrução fática no processo e por isso a máxima relevância desta proposta. A sociedade plural, marcada por diversas relações assimétricas, supõe não sermos todos iguais e a inversão do ônus da prova manifesta-se como instrumento que engendra as naturais desigualdades sociais nas relações processuais. A norma também sobrepõe às regras formais o princípio da justiça, entregando ao juiz autoridade para alterar a responsabilidade pela produção da prova em favor daquela parte que não tem aptidão para produzi-la. Reforça, portanto, operacionalmente, o direito do cidadão a uma decisão justa.” (REIS, Daniela Muradas. O projeto de Código de Processo Civil: perspectivas e impactos no Direito Processual do Trabalho. Palestra proferida no dia 22/11/2011 em Audiência Pública no Congresso Nacional [Comissão Especial do Projeto do novo Código de Processo Civil]).

[22]  BAGOLINI, L., Filosofia do trabalho: O trabalho na democracia. Trad. João da Silva Passos. São Paulo: LTr, 1997. p. 84. Sobre a participação política e trabalho confira ainda SILVA, Antônio Álvares da. Co-gestão no estabelecimento e na empresa. São Paulo: LTr, 1991.

[23]  A esse propósito: “A democracia não é um lugar onde se chega. Não é algo que se possa alcançar e depois se acomodar pois é caminho e não chegada. É processo e não resultado. Desta forma a democracia existe em permanente tensão com forças que desejam manter interesses, os mais diversos, manter ou chegar ao poder para conquistar interesses de grupos específicos, sendo que muitas vezes estas forças se desequilibram, principalmente com a acomodação da participação popular dialógica, essência da democracia que defendemos, e o desinteresse de participação no processo da democracia representativa, pela percepção da ausência de representatividade e pelo desencanto com os resultados apresentados.” MAGALHÃES, J. L. Q. de, O resgate da democracia representativa através da democracia participativa. In: Revista da Faculdade de Direito da Universidade Federal de Minas Gerais. nº 44, 2004, p. 189.

[24]  CEPAL. La hora de la igualdad: brechas por cerrar, caminos por abrir. Trigésimo Tercer Período de Sesiones de la CEPAL. Comisión Económica para América Latina y el Caribe (CEPAL) Website, Mayo 2010. Disponível em: <http://www.cepal.org/es/publicaciones/13309-la-hora-la-igualdad-brechas-cerrar-caminos-abrir-trigesimo-tercer-periodo>. Acesso em: 28 jul. 2016.

[25]  Vale a máxima, por tantas vezes já citadas, de Itamar Franco, que, quando questionado sobre o político (ético) e o econômico (poiético) “respondeu, ao lhe dizerem que não era possível conceder aumento aos militares, ao argumento de que as contas não mentem: ‘as contas, não, mas quem as faz, sim’”. (SALGADO, J. C., O estado ético e o estado poiético. Revista do Tribunal de Contas do Estado de Minas Gerais. Ed. 2., 1998, ano XVI. Disponível em: <http://200.198.41.151:8081/tribunal_contas/1998/02/-sumario?next=3>. Acesso em: 28 jul. 2016).

[26]  Arnaldo Süssekind, em conferência, lembrando Márcio Moreira Alves, demonstra que a economia passa a enfocar como centro de sua reflexão não o homem, mas os números. (SÜSSEKIND, A., A Globalização da Economia e a Organização Internacional do Trabalho. Conferência realizada na Faculdade de Direito da USP em 08/03/99).

[27]Nesse sentido, registre-se o entendimento da Corte Interamericana de Direitos Humanos acerca do caráter global para fins de cumprimento das obrigações internacionais decorrentes do art. 26 da Convenção Americana de Direitos Humanos. Segundo tal dispositivo “Os Estados Partes comprometem-se a adotar providências, tanto no âmbito interno como mediante cooperação internacional, especialmente econômica e técnica, a fim de conseguir progressivamente a plena efetividade dos direitos que decorrem das normas econômicas, sociais e sobre educação, ciência e cultura, constantes da Carta da Organização dos Estados Americanos, reformada pelo Protocolo de Buenos Aires, na medida dos recursos disponíveis, por via legislativa ou por outros meios apropriados”.

[28]  MURTEIRA, M. C., O essencial sobre a economia das pensões. Coimbra: Angelus Novus, 2011.

[29]  Nesse ponto, cita-se o Projeto de Lei nº 315 de 2015 do Senado, que cria o Imposto sobre Grandes Fortunas, em discussão na Comissão de Assuntos Econômicos desde setembro de 2015, bem como o PL nº 130 de 2012 da Câmara dos Deputados, de mesmo conteúdo e que está sujeito à apreciação do plenário desde 2012. Também pode ser trazido como exemplo de aplicação prática de justiça tributária o PL nº 588 de 2015 do Senado, que prevê a incidência de imposto sobre a Renda Retido na Fonte (IRRF), sobre a distribuição de lucros e dividendos, em discussão na Comissão de Assuntos econômicos há mais de quatro meses e sem previsão de votação. Todos eles se encontram paralisados.

[30]  BAYLOS, A., Excepcionalidade política e neoliberalismo: Europa e Brasil. In: PRONER, C.; CITTADINO, G.; TENENBAUM, M.; RAMOS FILHO, W. (Coords.). A Resistência ao Golpe de 2016. Bauru: Canal 6, 2016, p. 44-45.

[31]  COMPARATO, F. K., A afirmação histórica dos direitos humanos. São Paulo: Saraiva, 1999. p. 53.

[32]  Washington Peluso Albino de Souza, em suas Primeiras Linhas de Direito Econômico, esclarece que retrocesso tem caráter dinâmico, refere-se à modificação do status quo e traduz um sentido negativo. Traçando as diferenciações terminológicas entre desenvolvimento, crescimento e retrocesso, afirma: Para melhor situarmos o seu tratamento como tal, recorreremos à sua conceituação científica, quando as teorias a respeito o apresentam fundamentado no sentido dinâmico de modificação do status quo, na direção de configurações diferentes das atuais. A partir desse ponto, faz-se necessária a diferença entre o seu conceito e o de ‘crescimento’, podendo ambos incluir-se, sem qualquer confusão, na ideia de ‘progresso’. O dado referencial, diferenciador, pode ser tomado, portanto, como ideia de ‘equilíbrio’, a ele prendendo-se a de ‘desequilíbrio’. No ‘crescimento’, tem-se o ‘equilíbrio’ das relações entre os componentes do todo, podendo haver o seu aumento quantitativo ou qualitativo, porém mantidas as proporções dessas relações. No ‘desenvolvimento’, rompe-se tal ‘equilíbrio’, dá-se o ‘desequilíbrio’, modificam-se as proporções no sentido positivo. Se tal se verificasse em sentido negativo, teríamos o retrocesso, a recessão, embora também como forma de ‘desequilíbrio’, pois igualmente rompida com o status quo ante. (SOUZA, W. P. A. de, Primeiras linhas de direito econômico. São Paulo: LTD, 1999, p. 404).

[33]  Neste diapasão, podemos indicar o art. 30 da Declaração de Direitos do Homem, que estabeleceu que nenhuma de suas disposições poderia ser “interpretada como o reconhecimento a qualquer Estado, grupo ou pessoa, do direito de exercer qualquer atividade ou praticar qualquer ato destinado à destruição de quaisquer dos direitos e liberdades” nela estabelecidas. Ainda podemos citar o art. 5º do Pacto de Direitos Civis e Políticos, art. 5º do Pacto de Direitos Econômicos Sociais e Culturais, ambos de 1966, que prescrevem a inviabilidade das suas disposições serem interpretadas no sentido de reconhecer a prática de atos atentatórios aos direitos ou liberdades neles reconhecidos ou ainda de se lhes impor limitações mais amplas do que aquelas neles previstas. Além disso, constam dos Pactos de direitos humanos de 1966 a garantia de inviabilidade de “restrição ou suspensão dos direitos humanos fundamentais reconhecidos ou vigentes em qualquer país em virtude de leis, convenções, regulamentos ou costumes, sob o pretexto de que o presente Pacto não os reconheça ou os reconheça em menor grau”. No mesmo sentido a vedação ao retrocesso ainda foi expressamente reiterada nos diplomas internacionais de proteção aos direitos humanos de Teerã de 1968 e Viena de 1993. Outros diplomas internacionais também contemplam o princípio de vedação ao retrocesso, pugnando pela progressividade da proteção da pessoa humana. Neste sentido o art. 29 da Convenção Americana sobre Direitos Humanos; o art. 1.1 da Convenção contra a Tortura e o art. 41 da Convenção sobre os Direitos da Criança, entre outros. Na conclusão de MARTINEZ, “Em geral, os instrumentos internacionais de direitos humanos estabelecem que nenhuma de suas disposições autoriza a limitar os direitos protegidos em maior medida prevista, a limitar o gozo e exercício de qualquer outro direito ou liberdade que possa estar reconhecido em outra norma internacional ou interna em vigor, nem a excluir ou limitar o efeito que podem produzir as normas consuetudinárias em matéria de direitos humanos”. (MARTINEZ, G. O., Guía legal sobre la utilización de los convenios y recomendaciones de la OIT, para la defensa de los derechos indígenas. Serie Guías Legales – Derechos Indígenas. n. 3. San José: Oficina Internacional del Trabajo, 2002. p. 203).

[34]  GIALDINO, R. E, Obligaciones del Estado ante el Pacto Internacional de Derechos Económicos, Sociales y Culturales. Revista IIDH Instituto Interamericano de Derechos Humanos, 37, San José C. R., Janeiro-Junho 2003, pp. 87-133.

[35]  “La violación de obligaciones en materia de derechos humanos debido a “omisiones” por parte de los Estados, se encuentra claramente establecida en derecho internacional, no sólo en relación a los derechos de carácter civil y político, sino que también en referencia a los derechos de carácter económico, social y cultural”. (SEPÚLVEDA, M., La interpretación del Comité de Derechos Económicos, Sociales y Culturales de las obligaciones derivadas de la expresión “progresivamente” contenida en el artículo 2.1 del Pacto Internacional de Derechos Económicos, Sociales y Culturales. In: COURTIS, C., Ni un paso atrás: la prohibición de regresividad en materia de derechos sociales. Ciudad Autónoma de Buenos Aires: Del Puerto, 2006, p. 126).

[36]  Registre-se a opinião de Alexy, para quem se distinguem os deveres de providência em duas dimensões distintas. Em acepção mais larga, corresponde ao cumprimento do dever de proteção fundado no Estado de Direito, não apenas como um garante de padrões mínimos de justiça social, ao passo que em sentido estrito corresponde a um direito subjetivo a prestações fáticas decorrentes da atuação do Estado Social. (ALEXY, R., Teoría de los derechos fundamentales. Trad. E. G. Valdés, Madrid: Centros de Estudios Constitucionales, 1997, p. 395 et seq.).

[37]  Ressalte-se o posicionamento de Temer, para o qual, diferentemente do que pode demonstrar com sua atuação política, as normas programáticas são “dotadas de eficácia jurídica porque têm o efeito de impedir que o legislador comum edite normas em sentido oposto ao direito assegurado pelo constituinte, antes mesmo da possível legislação integrativa que lhes dê plena aplicabilidade.” (TEMER, Michel. Elementos de Direito Constitucional. 24. ed. São Paulo: Malheiros, 2015. p. 27).

[38]  Dentre os vários enfoques dados ao termo vulnerabilidade social, observa-se um razoável consenso em torno a uma questão fundamental: a qualidade do termo deve-se a sua capacidade de captar situações intermediárias de risco localizadas entre situações extremas de inclusão e exclusão, dando um sentido dinâmico para o estudo das desigualdades, a partir da identificação de zonas de vulnerabilidades que envolvem desde os setores que buscam uma melhor posição social, até os setores médios que lutam para manter seu padrão de inserção e bem estar, ameaçados pela tendência a precarização do mercado de trabalho. Tudo isso em confronto com a estrutura de oportunidades existentes em cada país em um dado momento histórico. Também a partir da delimitação crítica em relação ao termo exclusão, as discussões sobre o mercado de trabalho, segundo alguns estudos, teriam encontrado na definição de vulnerabilidade um maior poder explicativo, frente a um quadro cada vez mais complexo, dada a heterogeneidade das situações de precarização existentes. O conceito de vulnerabilidade, pela sua capacidade de apreensão da dinâmica dos fenômenos, tem sido, na opinião de muitos autores, apropriado para descrever melhor as situações observadas em países pobres e em desenvolvimento, como os da América Latina, que não podem ser resumidas na dicotomia, pobres e ricos, incluídos e excluídos. (REIS, D. M.; REIS, P. M., A vulnerabilidade como condição comum às vítimas do tráfico de seres humanos para a exploração do trabalho. Anais do XX Congresso Nacional do CONPEDI. Florianópolis: Fundação Boiteux, 2011, v. 1, p. 5399-5428).

[39]  LEITE, J., Estatuto jurídico-constitucional do salário: considerações a propósito do art. 19 da Lei n. 55-A/2010. In: REIS, D. M.; MELLO, R. D. de; COURA, S. B. de C. (Coords.). Trabalho e Justiça Social: um tributo a Mauricio Godinho Delgado. São Paulo: LTr, 2013. p. 282.

[40]  PERELMAN, C., Lógica Jurídica: nova retórica. Trad. Verginia K. Pupi. São Paulo: Martins Fontes, 2000. p. 123.

[41]  O princípio da igualdade jurídica atua em duas dimensões diferenciadas. A primeira, de caráter formal, importa em igualdade perante a ordem jurídica. Já na segunda, a igualdade atua no plano material como reconhecimento da igual dignidade da pessoa humana. Nesta dimensão atua como matriz da cultura jurídica democrática e instiga a generalização concreta de direitos. É de se notar que a Declaração proclamou de maneira solene que “toda pessoa tem o direito de ser, em todos os lugares, reconhecida como pessoa perante a lei” (art. 6º, in verbis, grifos acrescidos). Assim, a fórmula consagrada não deixa dúvida da feição eminentemente material do princípio da igualdade acolhida pela Declaração. Neste sentido, destaque-se, inclusive, que o dispositivo reportado à condição humana perante a lei precede o dispositivo que consagra a igualdade formal. Portanto, a igualdade no tratamento legal decorre do fato da igual dignidade da pessoa humana, de identidade, pois, substancial e, por esta razão, todos hão de ser “iguais perante a lei e têm direito, sem qualquer distinção, a igual proteção da lei”.

[42]  PIOVESAN, F., Direitos Humanos e diálogo entre jurisdições. In: MEZZETTI, L.; CONCI, L. G. A. (Coords.). Diálogo entre cortes. A jurisprudência nacional e internacional como fator de aproximação de ordens jurídicas em um mundo cosmopolita. Brasília: OAB, 2015. p. 100-101.

[43]  ASSIS, M. de, Teoria do Medalhão. In:______. Papéis avulsos. Rio de Janeiro: Lombaerts & C., 1994. p. 32. Disponível em: <http://machado.mec.gov.br/images/stories/pdf/contos/macn003.pdf> Acesso em: 3 ago. 2016.

[44]  SARLET, I. W., La prohibición de retroceso en los derechos sociales fundamentales: algunas notas sobre el desafío de la supervivencia de los derechos sociales en un contexto de crisis. In: COURTIS, Christian (Org.). Ni un paso atrás. Buenos Aires: Del Puerto, 2006. p. 329-359.

[45]  Deve-se destacar, neste ponto, que os princípios da norma mais favorável e o princípio da progressividade dos direitos sociais, embora relacionados, não se confundem. O princípio da norma mais favorável, cunhado na tradição justrabalhista, atua em dimensões distintas na ordem juslaboral (orientativa, interpretativa e hierarquizante) e enuncia que na criação, interpretação e aplicação da norma jurídica trabalhista deve-se considerar a melhoria das condições sociais do trabalhador. Na dimensão de fonte material, o princípio da norma mais favorável orienta o processo legislativo, estimulando a elaboração de normas que visem à elevação das condições sociais da classe trabalhadora. Ainda nesta ótica, o conteúdo normativo do princípio da norma mais favorável desponta como importante instrumento civilizatório, atuando na preservação dos padrões sociais já assegurados pelo ordenamento jurídico estatal. (Cf.: REIS, D. M., O Princípio da vedação do Retrocesso no Direito do Trabalho. São Paulo: Ltr, 2010).

[46]  STRECK, L. L., Hermenêutica Jurídica e(m) crise. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2003. p. 37-38.

[47]  BARROSO, L. R., O Direito Constitucional e a Efetividade de suas normas. Rio de Janeiro: Renovar, 2001. p. 158.